Manuscrito jesuíta revela conhecimentos inéditos na astronomia e cultura do século XVIII

Novas pesquisas sobre a obra descoberta em 2017, realizadas pelo pesquisador Ir. Edison Huttner, representam a identidade de indígenas e jesuítas que viveram nas 30 reduções da Província do Paraguai

27/01/2023 - 15h29
manuscrito jesuita

Foto: Giordano Toldo

A descoberta de pesquisadores da PUCRS liderados pelo professor da Escola de Humanidades, Ir. Edison Huttner, foi capa da primeira edição de 2023 da revista científica Visioni LatinoAmericare com sua pesquisa acerca do Manuscrito jesuíta de 1730, descoberto em 2017, na cidade de Panambi, no Rio Grande do Sul. O docente apresentou, em um dos periódicos mais importantes da Europa, suas recentes descobertas no Manuscrito – descrevendo a presença de conteúdos interdisciplinares, em versão bilíngue espanhol e latim –  escrito por jesuítas e indígenas Guarani em papel fabricado em Gênova, na Itália. 

O Manuscrito foi identificado quando Liane Janke, de Panambi, entrou em contato com Ir. Edison, relatando a existência da obra por herança familiar. Desde então, o docente e outros pesquisadores da PUCRS vêm realizando estudos para analisar o conteúdo e a estrutura física do Manuscrito. De acordo com o professor, a riqueza da obra está em suas temáticas agora explicadas e catalogadas, relatando em várias mãos a identidade de mais de 140 mil pessoas que viveram entre os séculos de XVII-XVIII nas 30 Reduções jesuítas da Província do Paraguai, cujas ruínas se encontram ainda hoje na Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai.  

“Os jesuítas e indígenas tinham em mãos um Manuscrito com conhecimentos de teologia, de cultura geral, das missões dos jesuítas na China e Japão, sobre os santos católicos, de astronomia e signos do zodíaco. Além disso, foram identificados importantes estudos de astronomia elaborados por Buenaventura Suárez, o primeiro astrônomo nascido na América”, destacou Ir. Edison.  

Sobre o Manuscrito e suas revelações 

Por meados de 1607, no início da implementação das 30 Reduções, os ensinamentos eram transmitidos na catequese e nas escolas, por livros vindos da Europa. Conforme explica o pesquisador, a criação artesanal de manuscritos foi uma alternativa no aspecto pedagógico, proporcionando aprendizagem e incentivando a prática da caligrafia, assim como possibilitou a produção de temas variados em um só livro, em formato conceitual de manuscrito.  

manuscrito jesuita

Foto: Giordano Toldo/PUCRS

Desta forma, o Manuscrito se destaca por sua perspectiva didático-pedagógica e de transmissão de conhecimentos, destinado para os mestres jesuítas que utilizavam o conteúdo para sua formação teológica, de magistério e de estudos como astronomia para a localização da redução. Os indígenas também eram leitores nas escolas das missões em sua formação de cultura geral. As pesquisas, realizadas pelo grupo da PUCRS composto por Ir. Edison, Eder Abreu Hüttner, Fernanda Lima Andrade e Rogerio Mongelos, revelaram que a astronomia e os 12 signos do zodíaco chegaram nas escolas das Reduções para fazer parte do conhecimento e do cotidiano já naquele período. 

Em outras páginas analisadas, foram encontradas a descrição do Reino do Japão e da China, citações sobre o cientista italiano Matteo Ricci e o jesuíta irlandês Richards Archdekin. Constam também estudos do famoso matemático e astrólogo alemão Cristovão Clávio, responsável por reformar o calendário gregoriano, ainda usado atualmente no mundo todo. Em outras partes do Manuscrito, também é citado Clemente XII, que foi Papa de 12 de julho de 1730 até 1740, demonstrando o conhecimento global que aquela população tinha na época e contexto. 

“Outro elemento importante do Manuscrito é a boa caligrafia. Os jesuítas ensinaram caligrafia para os indígenas das missões, tendo em mãos alguns livros trazidos da Espanha. Com isso, o Manuscrito é legível em todas as páginas, escrito por várias mãos, essa confecção artesanal é resultado da prática da boa caligrafia aprendida nas escolas das missões. Modificando algumas percepções, os indígenas escreviam bem e a escrita se tornou arte no período das Reduções jesuítas”, conta Ir. Edison.  

Astronomia e Buenaventura Suárez 

O pesquisador da PUCRS contextualiza que Buenaventura Suárez é responsável pelo primeiro telescópio construído em solo americano com materiais locais e com auxílio de indígenas missioneiros. Com os estudos em astronomia, tornou-se possível ter conhecimento sobre cada localização das Reduções no mapa, bem como ter ciência da localização de outras cidades famosas no mundo. Graças a disseminação dos estudos do pioneiro Buenaventura Suárez, as 30 Reduções se situavam no tempo e espaço, além disso seus estudos foram referência para matemáticos e cartógrafos que projetaram os melhores mapas daquele período. 

manuscrito jesuita

Foto: Giordano Toldo/PUCRS

Na época de publicação do Manuscrito, Suárez era referência para matemáticos e cartógrafos que projetavam mapas precisos e confiáveis, assim como era o astrônomo de confiança para as 30 Reduções. Sua participação na obra corresponde a 128 páginas sobre astronomia nunca publicados antes, ou seja, uma prova verídica dos estudos de transferência de conhecimento de astronomia realizado por Buenaventura Suárez.  

Com a análise dos pesquisadores da PUCRS, foi possível confirmar que as coordenadas presentes no Manuscrito foram utilizadas para o desenho dos primeiros mapas da região da época. Além disso, pela primeira vez na história, um manuscrito jesuíta apresenta símbolos da astrologia, como planetas e signos do horóscopo, graças aos estudos de Buenaventura Suárez, concluindo que indígenas e jesuítas das Reduções sabiam qual eram seus signos a partir de sua data de nascimento. Para Ir. Edison, estes conteúdos da Astronomia de Buenaventura Suárez alcançam uma nova visão de mundo daquele tempo, em plena ação e ideias de modernidade. 

“Os estudos e a prática da astronomia presente no Manuscrito revelam a consciência de espacialidade missioneira presente nas Reduções. Foram revelados conhecimentos de arquitetura de construção de observatório astronômico, relógios solares, torres (campanários), assim como a construção de mapas cartográficos. Desta forma conseguimos concluir que indígenas e jesuítas se moviam pelas matas para estabelecer novas reduções unindo conhecimentos ancestrais com noções de astronomia”, explica o docente.  Leia o artigo na íntegra

Leia também: Recuperação Judicial: pesquisadora explica como empresas podem sair da falência

Compartilhe

Outras notícias Veja todas as notícias

  • Últimas publicadas
  • Mais lidas