Aniversário de Porto Alegre: pesquisador é referência sobre história da cidade

Charles Monteiro tem trajetória extensa de pesquisa sobre memória, literatura e fotografias de Porto Alegre

24/03/2023 - 18h00
história de porto alegre

Foto: Flávio Carneiro e Thales Farias

Porto Alegre está completando 251 anos em neste dia 26 de março. Hoje, abordamos a história da cidade, fundada de 1772, com a criação da Freguesia de São Francisco do Porto dos Casais, um ano depois alterada para Nossa Senhora da Madre de Deus de Porto Alegre. A fundação da cidade está inserida no processo de conquista e expansão dos domínios portugueses ao sul do Brasil em direção ao Rio da Prata, conforme explica o professor e pesquisador da Escola de Humanidades Charles Monteiro. 

O docente dedica sua trajetória acadêmica para desenvolver diversas publicações e pesquisas em torno da história de Porto Alegre e do estado do Rio Grande do Sul. Em sua tese de doutorado, por exemplo, que resultou no livro Porto Alegre e suas escritas, o Charles propôs uma série de reflexões sobre como a história da capital gaúcha foi escrita por historiadores e literários a partir dos anos 40.

Fundação de Porto Alegre

Em participação no livro Viva o Centro a Pé, Charles apresenta uma breve linha do tempo dos acontecimentos que constituíram a cidade. O pesquisador conta que a província e a população do Rio Grande do Sul foram se formando a partir dos conflitos, das trocas comerciais e dos acordos políticos-militares entre portugueses e espanhóis.

Ambos os países foram polos de conquista e colonização do território meridional e disputavam a região povoada por vários grupos indígenas. Nesse período, em 1752, por conta do Tratado de Madri e do projeto da Coroa portuguesa de assentar colonos no território de Missões Jesuíticas, deu-se início ao processo de povoamento do Porto do Dorneles.

Casais açorianos rumando para as missões foram obrigados a aguardar transporte e a pacificação da região envolvida nas Guerras Guaraníticas. Eles então se instalaram próximos ao Arroio Dilúvio, nomeando a região como Porto de São Francisco dos Casais. Mais tarde então, o povoamento se torna a capital da Província, em 1773, passando a ser chamada Nossa Senhora Madre de Deus de Porto Alegre, que futuramente seria a cidade de Porto Alegre.

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Foto: Joseph Zakauska e Pedro Cavalheiro

Crescimento industrial e populacional da cidade

Avançando para o período da Proclamação da República, em 1889, o pesquisador Monteiro demarca a data como a fase do fenômeno urbano de reorganização social no espaço urbano, decorrentes das mudanças de estrutura política, social e econômica da sociedade brasileira.

“Porto Alegre era o centro político e o porto comercial de exportação e importação em expansão no fim do século 19. Esta evolução comercial e industrial da cidade acarretou seu crescimento populacional e urbano, na modernização dos espaços e dos serviços e nas mudanças de sociabilidade pública”, destaca o professor.

De acordo com Monteiro, Porto Alegre foi uma das primeiras capitais do país a ter um plano urbanístico voltado a atender o crescimento da cidade. Foram propostos alargamentos das ruas principais e construção de novas avenidas, dando início ao processo de industrialização e expansão populacional da cidade, no começo do Século 20.

Imagens de uma cidade moderna

O pesquisador Charles Monteiro também atua na linha de pesquisa em fotografia realizando ligações com sua formação em história. Um exemplo das publicações de sua autoria se destaca o estudo Imagens sedutoras da modernidade urbana: reflexões sobre a construção de um novo padrão de visualidade urbana nas revistas ilustradas na década de 1950. Com a pesquisa, o docente problematiza a forma como revistas ilustradas nos anos 1950 geriram a imagem de um país em transformação e em acelerado processo de urbanização através da fotografia.

Nos anos 50, no Brasil, aconteceu uma “revolução verde”, ocasionada pela introdução de novas técnicas agrícolas e pelo desenvolvimento capitalista no campo. De acordo com Monteiro, este período foi marcado por migrações em massa das regiões agrícolas para os estados mais industrializados. Um grande exemplo deste movimento foi o deslocamento de populações nordestinas para a construção de Brasília.

Neste período, as revistas ilustradas semanais e quinzenais surgiram como alternativa aos jornais cotidianos. Eram periódicos que ofereciam uma nova abordagem dos acontecimentos com imagens e elementos visuais mais chamativos. Elas desempenhavam um papel social influente na forma como a população brasileira passaria a pensar sobre uma variedade de assuntos – como política, artes, vida de famosos, esportes, opinião e entretenimento.

Na pesquisa realizada pelo docente da Escola de Humanidades, foi analisada a fotorreportagem Porto Alegre cresce para o céu e para o rio, da Revista do Globo, que destaca o processo de modernização da capital gaúcha. As fotos realizadas por Thales Farias ilustram a matéria ressaltando grandes construções civis que surgiram na época, como novos edifícios do centro, obras da Avenida Beira-Rio e a ponte sobre o Guaíba, porém os bairros populares da cidade e os problemas advindos desse crescimento não eram foco da revista.

O pesquisador comenta que ao analisar o discurso das revistas deste período é possível notar um maior engajamento pelo discurso de incentivo pelo desenvolvimento das grandes cidades, como Porto Alegre.

“Os principais periódicos passaram a focalizar essencialmente o processo de transformação e modernização da sociedade urbana, deixando de lado as críticas e as contradições que acompanhavam este processo. Com isso, concretizaram a utopia da cidade moderna numa verdadeira pedagogia social, dando velocidade ao processo de mudança de uma forma positiva”, explica Monteiro.

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Foto: Flávio Carneiro e Thales Farias

Memórias de uma cidade em transformação

No início dos anos 1970, Porto Alegre continuava seu processo de crescimento e transformação. A população da capital passou de 590 mil habitantes para 1 milhão e 530 mil em 1970, marcando o período por uma evolução dos espaços urbanos da cidade. Em sua pesquisa, intitulada como Duas leituras sobre as transformações da cultura urbana de Porto Alegre nos anos 1970: entre memória e ficção, o professor Charles Monteiro analisa narrativas sobre a década na cidade de Porto Alegre e como estas memórias influenciam os dias atuais.

O docente explica que mesmo com a modernização do espaço urbano, demolição acelerada de prédios antigos e a retirada dos bondes existia outro movimento que buscava preservar a memória da cidade. Cronistas, como Nilo Ruschel eram responsáveis por retratar a cidade do passado, uma cultura urbana que se organizava em cafés, bares e restaurantes. Com isso, foi criado o Museu de Porto Alegre Joaquim Felizardo e foram publicados diversos livros sobre a história da capital gaúcha.

Já os escritores, como Moacyr Scliar abordavam a capital do presente e do futuro, relatando seus problemas e contradições nas crônicas. Naquele período, o processo de crescimento da cidade parecia não ter mais volta. Bairros como Bom Fim, Cidade Baixa e Moinhos de Vento cresciam comercialmente e ganhavam vida noturna. Além disso, Porto Alegre tornava-se palco para grandes eventos, como a missa campal com a presença do Papa João Paulo II, em 1980.

Novas alternativas para problemas urbanos

De acordo com Monteiro, a transformação de Porto Alegre segue acontecendo com o passar dos anos. Entre 1991 e 2000, o IBGE apresentou uma taxa de crescimento populacional de 0,93%. Além disso, foram realizados diversos grandes eventos como o Fórum Social Mundial, que colocou a cidade no mapa político e turístico internacional, e a Bienal do Mercosul, que a cada dois anos promove debates artísticos-culturais e promove a integração entre diversos países.

O último grande evento que aconteceu na cidade foi a Copa do Mundo de Futebol de 2014, que atraiu turistas e hospedou as seleções esportivas da Argentina, Honduras, Alemanha, França, Holanda, Argélia, Nigéria, Coreia do Sul e Austrália. O episódio gerou calorosos debates sobre a infraestrutura da capital, e assim, foram propostos novos projetos de revitalização da Orla do Gasômetro, do Cais Mauá e do 4.º Distrito de Porto Alegre.

“Porto Alegre continua a defrontar-se com os desafios que o passado e o presente lhe deixaram, mas parece haver, mais do que em qualquer outro período anterior, maior consciência e participação da sociedade civil na discussão e na busca por alternativas viáveis para o enfrentamento dos problemas urbanos”, finaliza o docente.


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