29 de Setembro de 2020
  • Jornal do Comércio
  • Jornal da Lei
  • P. 19
  • 96.00 cm/col

Debate sobre meio ambiente ganha força na pandemia

No “novo normal”, pessoas procuram se aproximar mais da natureza

A pandemia do novo coronavírus impulsionou modificações em alguns ramos e rotinas do Direito. No Direito do Trabalho, por exemplo, houve a flexibilização das relações de trabalho e também a possibilidade de alteração nos contratos. Em relação às rotinas, com os foros fechados, observou-se a necessidade de tribunais 100% eletrônicos – no Rio Grande do Sul apenas Justiça do Trabalho e Justiça Federal têm a totalidade de processos digitalizados. No ramo do Direito Ambiental, mesmo que não se tenha observado grandes revoluções, ocorreram importantes debates, como a redução dos impactos ambientais provocados pelas indústrias, já que muitas empresas pararam temporariamente suas atividades, e a redução nas emissões de CO2 , resultado das restrições de viagens.

Além disso, o “novo normal” busca mais contato com a natureza. Em Porto Alegre, por exemplo, houve uma demanda maior por casas em regiões mais arborizadas, como a Zona Sul. Diante disso, o Jornal da Lei entrevistou especialistas da área do Direito Ambiental sobre aspectos relacionados à legislação no Brasil.

Queimadas no Pantanal

As queimadas no Pantanal aumentaram significativamente desde 2005. Segundo dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), em 2020, somente em setembro, houve uma alta de 109% comparado ao mesmo período do ano passado. Para o ex-secretário do Meio Ambiente de Porto Alegre, advogado e consultor de Direito Ambiental, Beto Moesch, o Direito Ambiental peca, nesse sentido, na legislação e na aplicação. “A legislação ambiental brasileira e estadual permite a queimada e isso é um grande erro.

É estranho, em pleno século XXI, defender uma agricultura moderna com queimadas. Mas isso também é questão de prática e fiscalização. Tem muita queimada não autorizada”, explica. Moesch acredita que a legislação ambiental é uma das melhores da América Latina, porém falta orçamento e entendimento da importância dela. “Se não tivermos recursos financeiros para aplicar a legislação e se não for trabalhado todo dia como se fosse uma prioridade, não vamos conseguir melhorar essa situação.”

Acordo de Paris

Os EUA anunciaram a saída do Acordo de Paris em 2017. Recentemente, o Brasil também passou a analisar a possibilidade de sair do tratado que rege medidas de redução de emissão de gases estufa, a fim de conter o aquecimento global abaixo de 2ºC. “A saída do Brasil não é tão simples quanto a dos EUA. Depende, inclusive, de aprovação de Congresso, porque foi ratificado pela Casa perto do impeachment da Dilma Rousseff, em 2016, pelo grupo que hoje forma a presidência”, argumenta o especialista em Direito Ambiental Marcos Tiraboschi. O advogado explica, que além de ter um trabalho político interno para que o Brasil se desconecte do Acordo de Paris, isso também pode ser um retrocesso para a economia e para as lógicas de proteção ambiental. “Querendo ou não, o Brasil é um País exportador e a saída do tratado geraria impacto nos grandes players e compradores lá fora, considerando que hoje já temos a história da restrição de área embargada”, acrescenta.

Lei Geral do Licenciamento Ambiental

O Projeto de Lei nº 3.729/2004, que discute a possibilidade de criar uma legislação federal de licenciamento ambiental, tramita agora no Congresso. Recentemente, a quarta versão do PL foi aberta para discussão. Para a advogada e professora de Direito Ambiental da Escola de Direito da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (Pucrs) Fernanda Medeiros, a esperança é de que seja finalizado neste ano. “É importante termos uma legislação federal porque não podemos seguir utilizando somente as resoluções do Conselho Nacional do Meio Ambiente e as normas estaduais”, defende. Entre os aspectos em discussão do novo PL, a professora se preocupa com as questões referentes ao Licenciamento por Adesão e Compromisso (LAC). “Uma coisa é fazer LAC quando tem baixo impacto, mas existe a possibilidade de algumas atividades agrícolas poderem fazer também. Dá um certo desconforto, porque não mediria o real impacto ambiental”, aponta. Fora isso, porém, ela acredita que o projeto está bem feito e vem em boa hora.

Flexibilização da legislação ambiental

Desde o início do governo Jair Bolsonaro, em 2019, fala-se sobre a possibilidade de flexibilização da legislação ambiental. Para o economista e advogado especialista em Direito Ambiental Alessandro Azzoni, a ideia não é flexibilizar, e sim tornar as normas ambientais mais claras. “Há uma mistura de normas ambientais federais, estaduais e municipais. As pessoas não sabem qual seguir e isso se confunde. Acho que a ideia de flexibilização é, na verdade, tornar as leis ambientais federais menos genéricas e mais claras”, explica.