Educação para o serviço: como desenvolver a liderança nas novas gerações

Vigário Geral do Instituto Marista, Luis Carlos Gutiérrez, aborda o tema em palestra na PUCRS

06/05/2022 - 18h06
educação para o serviço

Luis Carlos Gutiérrez, Vigário Geral / Foto: Diego Freitas

Nesta quinta-feira, dia 5 de maio, a PUCRS foi palco da palestra Liderazgo en la misión: innovación, pasión e identidad, ministrada por Luis Carlos Gutiérrez, Vigário Geral do Instituto Marista. O evento contou com a presença do Ir. Evilázio Teixeira, reitor da Universidade, Ir. Manuir Mentges, Vice-Reitor, Ir. Deivis Alexandre Fischer, Provincial da Província Marista Brasil Sul-Amazônia, e demais líderes da instituição. 

Durante a palestra, Gutierrez refletiu sobre as formas de desenvolver a liderança nos espaços educacionais, como nos ensinos Básico e Superior. De acordo com ele, é urgente um olhar atento e empático sobre as novas gerações, de forma que sejam estimuladas a busca incessante por conhecimento e a capacidade de adaptação.

“Precisamos desenvolver nas escolas, na universidade, no Instituto e no mundo a capacidade de liderança. Mas, como? Incentivando as novas gerações a desenvolverem novos líderes”. 

Gutiérrez aprofundou a temática em entrevista realizada pela Rede Marista. Confira!

1) O que significa a expressão Educação para o serviço?

Eu acredito que, quando falamos de Educação e Serviço, falamos de um aspecto fundamental da vida cristã e da imagem de Jesus. Nesse sentido, também da imagem de São Marcelino Champagnat: um homem inquieto socialmente, religiosamente, culturalmente, e que decidiu fazer uma mudança que teve grande significado para a sociedade do seu pequeno entorno – que depois se converteu em um amplo grupo de pessoas ao redor do mundo.  

Essa educação para o serviço, portanto, vai ajudar a conectar a formação pessoal, e, ao mesmo tempo, a estabelecer pontes com a comunidade no entorno, fazendo com que o indivíduo desenvolva competências sociais e projetos inovadores que tragam benefícios para a humanidade.  

Para isso, é necessária uma abordagem a partir de uma liderança para o serviço. É uma liderança capaz de escutar, que tem uma missão e uma visão antecipada, que sabe ensinar com as coisas, que tem um forte valor empático sobre as pessoas e a realidade, e que aposta no desenvolvimento comunitário em suas diferentes expressões. Que consegue curar e cuidar das relações e isso, por fim, vai ajudar a desenvolver um compromisso com o serviço e com o cuidado das pessoas.  

2) Como o Ensino Superior pode contribuir para essa missão educativa?  

Para mim, a universidade cumpre um papel fundamental de criar um diálogo entre os componentes formação pessoal dos(as) estudantes, projeção de futuro no campo profissional e experiência adequada e valiosa em um espaço acadêmico. Paralelo a isso, há a responsabilidade de criar um espaço de interação entre os elementos de diálogo social – como pôr em diálogo as sociedades locais com a universidade, como pôr em diálogo as ideias de inovação, desenvolvimento e empreendedorismo, como pôr em diálogo a transformação política que há nos espaços. Então, essa combinação universidade, governo, empresa, comunidade e por último, mas não menos importante, a questão religiosa e eclesial/religiosa social. Desse modo, a universidade cria esse espaço adequado para essa interação e ajuda a desenvolver um ambiente de transformação da realidade global.   

Para mim, uma das coisas que penso, se decidimos desenvolver pessoas para o serviço, então a universidade deveria apontar esse aspecto no caminho formativo, certo? Em outras palavras: é necessário curricularizar certos valores transversais em todo o processo educativo. Se o serviço pode ser aplicado a processos, em que se aprende através das disciplinas, como ler, compreender e propor mudanças nos processos de liderança, como forma de liderança das pessoas e como isso pode ser transferido ao desenvolvimento de iniciativas, empresas, eu acredito que será um serviço extraordinário.   

Eu também acredito ser necessário fazer um trabalho intenso, porque, obviamente, a sociedade é diversa e há muitas ideologias competindo ao mesmo tempo. Desde as mais marcadas por um individualismo, onde tudo praticamente se refere ao acúmulo de bens e benefícios pessoais, até outras posições. Então, como a universidade consegue juntar tudo isso e criar um sentido crítico de entrar em diálogo com as diversas posições e promover o que é próprio do sentido universitário e de uma comunidade maior. Então, eu penso que a partir desse ponto a universidade tem um importante e poderosa atuação.   

educação para o serviço

Foto: Diego Freitas

3) Como podemos nos conectar com a missão educativa marista no nosso dia a dia, nas salas de aula e nos corredores da universidade?

Em primeiro lugar, uma liderança para o serviço significa um interesse verdadeiro pelas pessoas. Aqui não entra competência, conhecimento, cargo, mas sim há uma intuição honesta em cuidar das pessoas e permitir que se desenvolvam.  

Por exemplo, quando caminha pelos corredores, você pode encontrar ambientes mais humanos ou mais descuidados, pode encontrar ambientes mais cordiais ou mais frios, pode encontrar, nos corredores, notícias como premiações ou pode encontrar notícias de pessoas que estão ajudando a sua comunidade, de programas de voluntariado, etc. Então, tudo isso tem a ver com uma cultura existente em sala de aula, com a forma como ensinamos e com a forma como a universidade conversa com a sua comunidade. 

Também uma universidade pode ter muitos programas, muitas formas de interagir com a comunidade a partir do serviço – programas de bolsas, de interação, de voluntariado, de auxílio à comunidade local. Então, essa inquietação de serviço vai se desenvolvendo progressivamente em experiências que põem as pessoas para viver essa “educação para o serviço” no seu cotidiano.  

4) O que o mundo pós-pandemia nos apresenta como desafio para essa educação para o serviço? E como oportunidade?

A pandemia mostrou ao mundo o quão efetivo pode ser um microrganismo, como um vírus. E quantas fatalidades ele pode causar. Ao mesmo tempo, com quanta rapidez a ciência pôde reagir a um tipo específico de vírus. E que consequências traz para um ambiente que vinha em uma escala crescente de um mundo globalizado em que os centros de produção estavam mudando completamente e que a posto à prova como as dependências de uns países com outros são cruciais para resolver tudo isso.  

Então, por outro lado, nos abriu uma nova dimensão porque a pandemia fez com que entrássemos nas casas dos alunos, professores, ou seja, foi construído uma ideia muito diferente do que significa aprender na universidade, comunicar-se com os outros, acabou com relações em muitos espaços, tivemos um momento de isolamento muito cruel, tivemos muitas mortes, descobrimos as formas diferentes de liderar o mundo para enfrentar isso, o papel das mulheres se destacou muito mais do que o dos homens em muitos lugares.   

A pandemia despertou uma introspecção profunda em muita gente e em outros despertou também as grandes perguntas sobre a existência. Eu acredito que este aspecto tanto pelo “que somos, que fazemos, como nos relacionamos, o que é importante na vida, que coisas que pensávamos que não aconteciam, mas que podem acontecer”. Eu acredito que foi aberta uma nova sensibilidade. Por isso, devemos tratar de capturá-la em sua sabedoria e projetá-la para o futuro.   

Eu acredito que para a universidade, toda essa mudança metodológica, a adaptação no campo da comunicação por meios online, a utilização de aulas a distância, o modelo híbrido e tudo o que se tem descoberto. Também serviram para que nos demos conta de que podemos chegar de outras maneiras. Em alguns casos, até podemos facilitar a aprendizagem.   

vigário geral

Foto: Laísa Mendes

O que me faz pensar que, particularmente, nas regiões mais remotas onde pode ser mais difícil o acesso à universidade, talvez essas descobertas da pandemia nos fizeram abrir uma porta interessante pensando no futuro e eu acredito que isso é algo muito importante.   

Eu penso que quando terminarmos esse processo de pandemia, ou quando estivermos no fim da pandemia, eu acredito que sim, devemos nos perguntar ‘que país queremos?’, ‘que mundo queremos?’, ’como queremos colaborar?’, ‘como queremos definir nossas relações?’, ’que aspectos da nossa humanidade são mais valiosos?’    

Sobre o Vigário Geral 

Ir. Luis Carlos Gutiérrez nasceu em 1967, na Espanha. Fez os primeiros votos no Instituto em 1986 e logo foi transferido para Guatemala, onde trabalhou no colégio da região e também na Costa Rica e Porto Rico. Fez estudos universitários em Estudos Sociais e Linguagem. É licenciado em ciências religiosas e em teologia, mestre em administração e supervisão educativa e é doutor em educação.  

Foi professor em diferentes contextos e se destaca pela paixão pelo ensino, que vê como espaço de transformação, humanização e evangelização. Desde dezembro de 2013 foi provincial da América Central, além de ser membro da Comissão de Missão e Subcomissão de Educação da Conferência Interamericana de Provinciais, da qual foi coordenador do Conselho Permanente. Em 2017 foi eleito a Vigário Geral onde atua até o momento.   

Leia também: O que as organizações aprenderam com a pandemia?


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