OpiniãoFoto: Camila Cunha

Orações e fé para a saúde física e mental

Artigo de André Luiz da Silva, Professor da Escola de Medicina e monge zen budista da ordem SotoShu

Segundo a Spiritual Care Consensus Conference, espiritualidade é a maneira como as pessoas buscam e expressam significado às coisas e a forma como manifestam sua conectividade ao momento, a si mesmos, aos outros, à natureza e ao sagrado. Religião é uma espiritualidade compartilhada por um grupo de indivíduos, frequentemente com crenças e práticas em comum.

Crenças e práticas religiosas são comuns entre pacientes na área da medicina. Até mesmo entre aqueles que se dizem não religiosos, em algum momento de enfrentamento de uma doença, identificam-se como espiritualizados. Os doentes buscam aliviar sintomas e aceitar seu tratamento por meio de rituais e crenças espirituais e, mesmo os que nunca foram espiritualizados, quando se defrontam com a fragilidade da vida e o estresse que vêm junto com a doença, buscam força e paz em práticas sequer antes experimentadas.

Assim, podemos usufruir de algumas técnicas de abordagem espiritual existentes na tentativa de facilitar o cuidado integrado. Em primeiro lugar, o médico deve colher um resumo da história espiritual do paciente e documentá-la. O melhor momento para isso é na nota de internação hospitalar, durante uma nova evolução ou como parte de uma consulta de rotina de um paciente hígido.

Antes de iniciar a história espiritual do paciente, o médico explica a razão de tais perguntas. Explicar que faz parte de um cuidado integrado e que tais perguntas são aplicadas a todas as pessoas enfermas. O doente deve ser tranquilizado de que essa prática não tem relação com o tipo ou a severidade de sua condição médica, que é uma rotina usada para todos.

Quando se percebe que as crenças religiosas o ajudam a lidar com a doença, é apropriado apoiá-lo e encorajá-lo, além de organizar um plano inserindo práticas religiosas no seu cuidado. Por exemplo, entrar em contato com o sacerdote de sua igreja. De qualquer maneira, se o profissional de saúde não tem treinamento para aconselhamento espiritual, basta oportunizar que o paciente compartilhe suas crenças, devendo depois encaminhar o caso ao seu responsável religioso.

“Religião e espiritualidade ajudam as pessoas a lidarem melhor com adversidades, melhoram aspectos da saúde mental e interferem nas condutas médicas. Mas ainda precisamos de mais evidências, a fim de mostrar o benefício da abordagem espiritual no tratamento dos pacientes”

O psiquiatra Harold Koenig desenvolveu um questionário chamado CSI-MEMO, a fim de auxiliar o médico na coleta de dados sobre a história espiritual do paciente, a qual deve ser breve e tomar somente cerca de dois a três minutos do tempo da consulta:

  1. Suas crenças religiosas/ espirituais oferecem conforto, ou elas são fonte de estresse?
  2. Você possui crenças espirituais que possam influenciar nas suas decisões médicas?
  3. Você faz parte de alguma comunidade espiritual ou religiosa, e ela oferece suporte a você?
  4. Você possui alguma outra necessidade espiritual que gostaria que fosse atendida por alguém?

Cuidar do paciente é o que nos traz alegria e realização profissional na prática da medicina e é o motivo pelo qual muitos de nós escolhemos essa profissão. Por isso, a ausência desse cuidado completo, principalmente em ambientes de trabalho cuja pressão é constante, pode levar à insatisfação e exaustão emocional. A prática da medicina baseada no cuidado integral é a forma mais satisfatória para aqueles que recebem e para os profissionais, pois além de aplicarem a medicina com plenitude, obtém-se sucesso mútuo nos resultados.

Muitas ferramentas ainda devem ser estudadas para que a abordagem completa do paciente, no que diz respeito à sua espiritualidade inserida no contexto da saúde, seja aprimorada e mais bem difundida entre os médicos. Mas certamente investir na espiritualidade durante o tratamento tem se mostrado eficaz, principalmente no que se refere à saúde mental. Em síntese, religião e espiritualidade ajudam as pessoas a lidarem melhor com adversidades, melhoram aspectos da saúde mental e interferem nas condutas médicas. Porém ainda precisamos de mais evidências a fim de mostrar o benefício da abordagem espiritual no tratamento dos pacientes e é necessário mapear nosso País quanto às diferentes manifestações religiosas com o intuito de interagir da melhor forma sobre as questões espirituais de cada pessoa.

Espiritualidade e ciência se conectam na interação voltada ao cuidado humano em que a fé e os caminhos que conduzem a ela são corresponsáveis pelo apoio que precisamos no tratamento de nossas enfermidades, sejam elas físicas, emocionais, mentais ou de outra natureza.