Saúde

Impacto da depressão na epilepsia

Em um modelo experimental, estudo mostra piora do quadro quando as duas doenças estão associadas

Pesquisadores no InsCer: Gabriele Zanirati (E), Gianina Venturin, Samuel Greggio e Pamella Azevedo

Foto: Bruno Todeschini

Integrantes do Laboratório de Neurociências do Instituto do Cérebro do Rio Grande do Sul (InsCer) fizeram um estudo mostrando que, quando a depressão está associada à epilepsia, acaba contribuindo para a piora do quadro em um modelo experimental. Animais com as duas doenças tiveram maior redução do metabolismo cerebral, ou seja, da atividade do cérebro, quando comparados a animais epilépticos sem depressão. Também apresentaram um maior número de conexões anormais na rede metabólica cerebral entre regiões envolvidas com ambas as patologias.

A partir dos resultados, o grupo busca novas estratégias eficazes e seguras para prevenção e tratamento. O projeto abre caminho para estudos de redes metabólicas em portadores de epilepsia e depressão, com potencial não só para diagnóstico mais preciso, mas também para escolha e avaliação da terapêutica”, destaca o coordenador da pesquisa, diretor do InsCer e professor da Escola de Medicina, Jaderson Costa da Costa. A ideia é mais adiante realizar um estudo clínico, envolvendo pacientes.

A depressão é considerada a condição psiquiátrica mais frequente em portadores de epilepsia, atingindo de 30% a 35% deles. “Embora os aspectos psicossociais possam contribuir para o desenvolvimento de depressão, pesquisas sugerem, cada vez mais, que a relação entre ambas está associada a mecanismos neurobiológicos comuns, como alteração na expressão de neurotransmissores envolvidos nas duas doenças, processos neuroinflamatórios e desregulação do eixo hipotálamo-pituitário-adrenal – responsável pelo controle neuroendócrino”, explica a bióloga Gabriele Zanirati, autora do estudo e em estágio pós-doutoral no InsCer. Mas isso ainda não foi totalmente desvendado pelos cientistas.

METODOLOGIA DO ESTUDO

Procurando a correlação desses mecanismos com o comportamento depressivo, o grupo investigou possíveis alterações no metabolismo cerebral em ratos com epilepsia do lobo temporal. Esse é o tipo mais frequente e refratário ao tratamento, ou seja, cerca de 30% dos pacientes deixam de responder aos anticonvulsivantes. Também é comum que apresentem declínio cognitivo e depressão.

A avaliação foi feita por exames na microtomografia por emissão de pósitrons (microPET), uma ferramenta de alta tecnologia disponível no Centro de Pesquisa Pré-Clínica do InsCer. “Com esse exame, nós conseguimos verificar quais regiões consomem mais ou menos glicose, a principal fonte de energia cerebral”, explica Gabriele. Através da injeção de um radiofármaco, é possível visualizar e quantificar dados moleculares funcionais em animais de pequeno porte. Foi utilizado o Fluorodesoxiglicose marcado com Flúor-18 (18F-FDG), análogo da glicose. “Quanto maior o consumo, maior é a atividade no órgão”, esclarece Pamella Azevedo, bióloga e uma das coautoras do estudo.

Para avaliar o comportamento depressivo, a equipe fez testes já estabelecidos na literatura. Após, os animais epilépticos foram divididos em dois grupos: não depressivos e depressivos (ou seja, que apresentaram esse comportamento, porque, assim como os pacientes, nem todos os animais com epilepsia desenvolvem os sintomas de depressão). “O estudo demonstrou que a depressão desempenha um papel importante no cérebro epiléptico, revelando alterações relevantes e complexas no metabolismo e na rede metabólica cerebral envolvendo regiões relacionadas com ambas as patologias”, afirma Gabriele. Os animais que demonstraram menor metabolismo cerebral também apresentaram um comportamento  depressivo mais exacerbado durante os testes avaliados.

Os pesquisadores chamam a atenção dos profissionais da saúde para que busquem o  diagnóstico precoce a fim de prevenir o impacto da depressão na qualidade de vida dos pacientes. “Seguiremos estudando os mecanismos comuns entre essas duas patologias para possibilitar a busca por novas alternativas de prevenção e tratamento”, informa Gabriele.

O estudo teve financiamento do CNPq, Capes, PUCRS e Pandurata. Foi recentemente publicado na revista internacional Epilepsia Journal. Além de Costa da Costa, Gabriele e Pamella, Gianina Venturin, Samuel Greggio, Allan Alcará, Eduardo Zimmer e Paula Feltes, todos pesquisadores ligados ao InsCer, assinam o artigo.

O artigo completo está disponível on-line em http://bit.ly/ncbi-depression

Entenda melhor

188Saúde(Foto2)Imagens de exame de microPET mostram redução no metabolismo de glicose em ambos os grupos de animais epilépticos, com e sem depressão, comparados aos saudáveis. As cores mais quentes (vermelho-amarelo) significam maior consumo de glicose no cérebro e as mais frias (verde-azul), menor consumo. Porém, a diminuição da atividade cerebral é maior no grupo com ambas as patologias.

FONTE: EPILEPSIA JOURNAL