Senhoras e senhores, alguns agradecimentos:
Um agradecimento especial à Entidade Mantenedora Marista, aos irmãos da província Sul Amazônia pela confiança em mim depositada, bem como ao Ir. Joaquim Clotet, com quem tive a oportunidade de trabalhar junto, durante o período de seu reitorado. Aos meus familiares (de modo especial meus pais, Ari e Ignez, in memoriam). Aos meus coirmãos de caminho e amigos que me desafiam cotidianamente a ser um constante aprendiz e a empenhar-me na construção de um mundo melhor. A todos que, ao longo da minha vida, me apoiaram na minha formação e crescimento intelectual, humano e espiritual. A Deus que, na sua graça e misericórdia, concedeu-me o milagroso dom da vida e Quem, nas sábias palavras do Salmo 126, o salmo predileto de Marcelino Champagnat, conduz e sustenta as nossas vidas: “Se o Senhor não constrói a casa, em vão labutam os construtores, se o senhor não constrói a cidade, em vão vigiam as sentinelas”.
Nesta jornada que iniciamos, destaco a alegria em ter o Professor Dr. Jaderson Costa da Costa ao meu lado. Jaderson é um profissional comprometido com a obra marista e com o desenvolvimento da Universidade, defensor da excelência acadêmica, um empreendedor. Juntamente com a Vice-Reitoria, aceitou continuar diretor do INSCER de modo pro-tempore. Grato, Jaderson, pela tua disponibilidade, diálogo franco e aberto, companheirismo e confiança mútua que deve nos acompanhar nesta desafiante missão.
Desde a origem presente na tradição, está a ideia de que o conhecimento é libertador: há uma virtude moral que se orienta para a busca do bem e também uma virtude intelectual que significa a busca da verdade; e ambas são facetas de uma mesma realidade.
Em 1810, Wilhelm von Humboldt fundou a Universidade de Berlim e seu primeiro reitor foi o grande filósofo Johann Gottlieb Fichte (1811-1812), sucedido mais tarde por Hegel (1829). O modelo humboldiano apresenta três dimensões, que, embora distintas, estão integradas e são complementares:
Uma proposta
O grande desafio é como garantir uma formação integral combinando três as três dimensões: visão de mundo, investigação, formação. Formação integral está além de uma mera formação estritamente acadêmica. Proponho que nossos estudantes, docentes e técnicos, em todos os níveis, possam realmente viver o ambiente acadêmico enquanto oportunidade de formação e crescimento em todos os sentidos; formação que expressa no diálogo permanente com toda a comunidade universitária, particularmente entre professores e estudantes.
Proponho ainda quatro valores fundamentais:
Além da excelência e da solidariedade, poderíamos ainda elencar outros três valores acadêmicos como lastro de uma Universidade no cumprimento de sua missão:
Pluralismo, universalismo e ética
Aqui se coloca a importância do diálogo entre todas as instâncias que fazem parte da Universidade, e dessa para com a sociedade. A integração pessoal de diferentes setores e serviços; a aproximação entre dirigentes, docentes, discentes e técnicos administrativos. Aprofundar nossa identidade, conhecer melhor a nossa PUCRS, suas potencialidades e seus limites para amá-la e comprometer-se com ela. Em grandes linhas, os problemas das Universidades são, de modo geral, muito semelhantes. A problemática parece a mesma, ao menos no terreno da reflexão e da discussão. Que está se passando? O início do século XXI trouxe consigo a reiteração de uma velha aspiração: a de que os complexos problemas econômicos, políticos, culturais e sociais podem ser resolvidos por meio da educação e, de modo especial, pelas instituições de educação superior. Afirma-se que a primeira metade do século XXI será mais difícil, inquietante e mais aberta em relação ao século passado. O período de transição que estamos vivendo e viveremos será uma época de perturbação, incerteza e criatividade no qual continuará a luta por uma boa sociedade.
Um convite: a PUCRS – uma grande comunidade
Quando falo de comunidade, estou me referindo à experiência de pertença, estamos em comunidade cada vez que nos encontramos num lugar onde nós pertencemos. Aquele sentimento profundo que fazemos parte de algo que é maior que nós. Pertencer é ter aquela certeza, que mesmo no meio da noite, estamos entre amigos. É a capacidade de estar presente e encontrar o propósito mais profundo em tudo o que fazemos. Experimentar a sensação de segurança que surge de um lugar onde estamos emocionalmente, espiritualmente e psicologicamente inteiros e como membros. Aqui poderíamos falar de hospitalidade e compromisso. Aprender uns com os outros, e que as nossas relações sejam um exemplo vivo de como gostaríamos que fosse o futuro. Vivemos em um momento de muitas mudanças. Essas mudanças não se limitam à nossa Universidade, portanto, torna-se necessário olhar para além dela, mas, ao mesmo tempo, entendê-la como uma Instituição que se faz em cada um de nós.
Talvez uma imagem que poderia nos ajudar – é aquela dos índios aymaras. Eles têm um poema que poderíamos aplicar à nossa Universidade. Esse poema de muitos séculos atrás, elaborado por um dos mais primitivos povos do mundo, tem muito a nos ensinar. Segundo eles, para ter felicidade, uma pessoa precisa de sete olhares ou de sete harmonias.
Temos um posicionamento estratégico claro de Inovação e Desenvolvimento. Reitero que o que fazemos na PUCRS deve impactar no desenvolvimento social, ambiental, científico, cultural e econômico da sociedade.
Destaco aqui alguns dos nossos 12 objetivos estratégicos:
Outros objetivos que devem também nos mobilizar: desenvolver parcerias institucionais internacionais; promover a interação cultural e social; ampliar fontes de captação de recursos; implementar a inovação e o desenvolvimento na área acadêmica; viabilizar o desenvolvimento de novos empreendimentos a partir do conhecimento gerado; preparar a comunidade universitária para os desafios da sociedade.
Estou falando dos sete olhares propostos pelo tribo Aymã. O segundo olhar diz o seguinte:
2º Olhar para trás, com o seu futuro desconhecido, para não ter medo nem ansiedades. O final do século XX caracteriza-se por transformações rápidas e de grande profundidade que impactam a vida social e trazem novas diretrizes à educação superior. Numa sociedade que se caracteriza por ser mais aberta e competitiva, envolta em redes globais de comunicação e com uma acelerada expansão do conhecimento avançando em direção a novas formas de trabalho, questiona-se o modelo tradicional e o papel da universidade, inclusive suas formas de operação vigentes até bem pouco tempo. A universidade precisa ser agente da mudança que deve ser incorporada como processo permanente em sua própria organização e procedimentos. A mudança pode ser vista como oportunidade e não como ameaça de desestabilização da própria instituição ou das pessoas que a integram. Fala-se muito de crise. Talvez um dos equívocos tenha a ver com o fato que as verdades científicas tendem a erigir-se em verdades autônomas e originais. Reduzem a certeza humana a dados experimentalmente controlados.
3º Olhar: Para cima, com os deuses e os espíritos, para ter uma razão superior para existir e um papel superior a cumprir. A Universidade é um “espaço de evangelização”. Por isso, dentro do marco de liberdade que implica toda opção de fé, ela quer propiciar aos nossos estudantes, professores e técnicos administrativos uma vivência autêntica do Cristianismo, em um ambiente marcado pelos valores evangélicos, a explicitação sistemática da fé e o acompanhamento em seu compromisso de vida. Os estudantes são convidados a reconhecer em sua identidade pessoal a dimensão transcendente que os abre à realidade, às demais pessoas e a Deus, além de descobrir seu projeto de vida, inserindo-se conscientemente como construtores da comunidade humana. Livre é a pessoa que é capaz de sair de si para assumir o chamado profundo que brota de seu interior, de chegar até Deus que a criou.
4º Olhar: Para baixo, com a Terra, e o mundo onde vive, para canalizar sua energia e agir. Vale a pena aqui fazer referência ao Papa Francisco que, na sua Encíclica Laudato Sí, apela para a união de toda a família humana na busca de um desenvolvimento sustentável e integral, afirmando: “O mundo é algo mais do que um problema a resolver; é um mistério gozoso que contemplamos na alegria e no louvor” (LS 12). É fundamental integrar o que aprendemos com a nossa vida. Entender alguma coisa e não aplicá-la é realmente não entendê-la. Nesse particular, vale a pena a afirmativa de Goethe: “O autoconhecimento se aprende melhor não pela contemplação, mas pela ação. Procure cumprir seu dever e logo descobrirá do que você é feito”. A educação deve ser permanente: é uma construção contínua da pessoa, de seu saber e de suas aptidões, mas também de sua faculdade de julgamento e da ação. A educação deve permitir que a pessoa tenha consciência dela mesma e de seu desenvolvimento. A educação, ao longo de toda a vida, diz respeito ao conhecimento, aptidões, valores e atitudes. Espera-se da Universidade muito mais do que isso, não apenas formar profissionais competitivos para o mercado de trabalho, como em geral vem fazendo. Se a Universidade quiser ter êxito na formação das próximas gerações, deverá formar um ser humano capaz de conhecer a si mesmo e conviver em harmonia com esse mundo globalizado e holístico.
5º Olhar: Para o lado esquerdo, com sua família e amigos, para que sua vida pessoal seja motivo de alegria. A educação, seja ela feita pela família, pela comunidade ou pela escola-universidade, deve ajudar o indivíduo a se conscientizar de sua própria situação social, ajudando-o a desenvolver uma atitude de empatia para com os problemas que envolvem a sociedade da qual esse mesmo indivíduo faz parte, querendo ou não. Isso implica buscarmos objetivos comuns. Quantos conflitos podem ser superados quando aprendemos a trabalhar juntos? A construção do espírito de família, isto é, aprender a trabalhar junto significa um grande mutirão social onde todos os seguimentos da sociedade estariam envolvidos, onde Universidade e comunidade interageriam e buscarim soluções comuns.
6º Olhar: Para o lado direito, com os vizinhos e o seu país, para que a sua vida social seja útil. Inserida nas questões sociais que envolvem o mundo contemporâneo, a Universidade precisa ser o lugar onde se ventilam temas fundamentais que tocam a pessoa e a sociedade. A Universidade não pode perder o contato com a realidade humana, evitando os extremos. Um deles poderia ser o da “tentação” de um trabalho puramente acadêmico, perdendo-se na selva dos conceitos e abstrações. Outra “tentação” poderia ser a de cair na absorção dos problemas do momento, levando a uma perda de uma visão de conjunto do processo histórico, e a relação da ordem social com a ordem ética e com os valores do espírito. Trata-se, portanto, da formação de profissionais tecnicamente qualificados e também comprometidos com a cidadania, corresponsáveis pelos destinos humanos, especialmente os mais pobres e relegados. Defender e promover os Direitos Humanos nos interpela a ações decididas e corajosas na construção da Casa Comum. Cabe a cada um de nós e à Universidade, enquanto instituição, criar e fortalecer comunidades com pessoas que se comprometam na construção de uma solidariedade sempre mais efetiva por meio do respeito à vida e a tudo que é humano.
7º Olhar: Para dentro de si, com o seu coração, para reconhecer e usufruir das outras seis harmonias. A formação universitária deve contribuir para o desenvolvimento total do indivíduo – espírito e corpo, inteligência, sensibilidade, senso estético, responsabilidade pessoal, espiritualidade.
O fundamento do conhecimento é o prazer de compreender, de conhecer, de descobrir. Aprender para conhecer supõe primeiramente aprender a aprender. Pelo exercício de atenção, de memória e de pensamento. Aprender a conhecer e aprender a fazer é de certa forma indissociável; quer dizer, adquirir os instrumentos da compreensão para poder agir sobre o meio. Aprender a viver com os outros: conviver. O mundo atual é demasiado violento e isso contradiz de certo modo a esperança que temos no progresso da humanidade. Não é possível nem mesmo apropriado que cada indivíduo acumule ao longo de sua vida apenas um estoque de conhecimento. Será preciso, sobretudo, que seja ao longo se sua vida capaz de aprofundar, enriquecer esse conhecimento primeiro, e se adaptar a um mundo em mudança.
Concluindo: Fazemos parte de uma grande Rede Marista – chamada também de Província Sul Amazônia – que envolve Colégios – Unidades Sociais – Hospital São Lucas e PUCRS.
A Conferência Mundial sobre o Ensino Superior, ocorrida em 1998 (Paris), recorda que a missão das instituições do Ensino Superior é de educar, formar e realizar pesquisas e, de forma particular, contribuir para o desenvolvimento sustentável e o melhoramento da sociedade como um todo. Espera-se promover, gerar e difundir conhecimento por meio da pesquisa e, como parte de sua atividade de extensão à comunidade, oferecer assessorias relevantes para ajudar as sociedades em seu desenvolvimento cultural, social e econômico, promovendo e desenvolvendo a pesquisa científica e tecnológica, assim como os estudos acadêmicos nas ciências sociais e humanas. Isso requer padrões éticos, capacidade crítica e articulação com a sociedade.
O papa João Paulo II, na sua Encíclica Ex corde ecclesae, em 1990, escreveu: “A Universidade, como qualquer outra instituição, está chamada, sempre no âmbito de sua competência, a ser instrumento cada vez mais eficaz de progresso cultural, tanto para as pessoas, como para a sociedade. As suas atividades de pesquisa, portanto, incluirão o estudo dos graves problemas contemporâneos, como a dignidade da vida humana, a promoção da justiça para todos, a qualidade de vida pessoal e familiar, a proteção da natureza, a procura da paz e da estabilidade política, a repartição equânime das riquezas do mundo e uma nova ordem econômica e política, que sirva melhor à comunidade humana nacional e internacional. A pesquisa universitária será dirigida a estudar em profundidade as raízes e as causas dos graves problemas do nosso tempo, reservando atenção especial às suas dimensões éticas e religiosas”. Somos convidados, na Universidade, a integrar dois milagres: o primeiro é a vida mesma, que sempre acontece de novo, como se fosse pela primeira vez. O segundo é o pensamento, que não possui limite, nem consegue parar, mas que nos conduz ao infinito.
O locus da Academia, portanto, será necessariamente o seu papel junto à sociedade, uma vez que no processo de produção do conhecimento acadêmico deve inserir-se no meio social, já que dele vem o substrato para compreensão dos fenômenos físicos ou sociais, e por outro lado, esse conhecimento deve ser socializado, retornando à sociedade sob a forma de soluções geradas pelo próprio processo de produção do conhecimento. Utilizando uma expressão de Marcovitch (1998), uma Universidade deve ser integrada, no sentido de administrar bem os escassos recursos, empreendedora, entendida como aquela que sabe antecipar o futuro, generosa, sensível à exclusão social. Somos todos convidados a cumprir a missão essencial da universidade e, consequentemente, a missão de todos nós: preparação profissional, formação científica, procura e transmissão da verdade. Não esquecer, porém, a importância da gratuidade do convívio humano e do cultivo das nossas relações. Somos convidados a propor o paradigma e a cultura da solidariedade, e da partilha; o gozo do humano compartilhado e a rica diversidade presente nas diversas culturas, o espírito de gentileza, esprit de finesse, (BOFF, 2003), a ética do cuidado, de reverência para tudo o que é humano e vivente.
A toda a comunidade: professores, técnicos e estudantes; à equipe que assume hoje, (pró-reitores, diretores das pró-reitorias, diretores de Unidades e de Institutos, decanos, decanos associados, assessores, coordenadores e todos que fazemos parte da família PUCRS), somos corresponsáveis pelo futuro e perenidade desta Instituição. Conclamo a todos que trabalhemos juntos pelo melhor da nossa Universidade – com transparência, simplicidade e dedicando o melhor das nossas energias. Que, ao iniciar esse novo quadriênio, sejamos todos ungidos pela luz necessária ao exercício da missão, com sabedoria, coragem e humildade.
Muito obrigado!!!
Reitor Ir. Evilázio Teixeira
9 de dezembro de 2016